sexta-feira, 20 de maio de 2011

A estética e a linguagem da TV para o cinema

Guel Arraes é, sem dúvida, um bom diretor. Seus filmes sempre são campeões de bilheteria no país e imensamente comentados nos principais meios de comunicação brasileiros. Com certeza estão entre a lista de filmes preferidos de muita gente. Obras memoráveis de sua direção, como por O Auto da Compadecida, Caramuru: A Invenção Do Brasil e Lisbela e o Prisioneiro,foram mini-séries da TV Globo (também dirigidas por ele) antes de se tornarem filmes, sendo que tais mini-séries foram construídas a partir de clássicos da literatura de Ariano Suassuna, Santa Rita Durão e Osman Lins.

Arraes também faz parte da geração de diretores da chamada Retomada do Cinema Brasileiro, principalmente no que se refere ao apuro tecnológico e pura padronização. Essa fase, iniciada a partir de 1995, foi de grande importância para o cinema nacional. Significou o retorno do público as salas, mesmo que para assistir filmes na viés infantil. O aparente sucesso do Plano Real e as Leis de incentivo a cultura foram favoráveis para a produção cinematográfica, o que resultou em altos investimentos em mão-de-obra e tecnologia. Guel iniciou sua carreira no cinema em 2000, dois anos depois da criação da Globo Filmes.


Em meio a essa transposição de artes o que nos interessa é a estética e a linguagem da TV para o cinema, claramente percebida nos filmes de Arraes. Por exemplo, embora o primeiro filme retrate o sertão árido, o segundo o Brasil de 1500 e o terceiro o nordeste mais moderno, a lógica de produção é lúdica, assim como nas novelas, e as narrativas acontecem de modo acelerado. É preciso ficar atento a tela para não perder nenhum detalhe.

Esse “cinema de TV” é apresentado de forma requintada (carros, figurinos, produção de moda, figurantes, etc), faz-se uma mega produção para se aproximar da realidade (mas talvez se afaste dela) diferentemente do cinema realista que usa ambientes verdadeiros em suas produções. As cenas são sedutoras, nada causa repulsa no espectador de imediato. Tenta-se tornar belo o que aparentemente é ruim para nós.

Rubens Ewald Filho entrevista Guel Arraes



A entrevista dura 40 minutos, mas vale a pena! Em um momento Arraes fala de suas experiências na França, durante o período em fez parte do Comitê de Filmes Etnográficos, e do fato de não ir a cinema para assistir filmes como Superman.






Confira no link: http://mais.uol.com.br/view/122867

ARRAES fala sobre o fato de seus filmes serem produções comerciais

 “O grande dogma do cineasta é que ele tem que escrever seu roteiro e dirigir. Acontece que um bom diretor, um bom realizador, não é necessariamente escritor. E a obrigação de escrever seu próprio roteiro resulta em algumas coisas horríveis. É terrível se obrigar a fazer uma obra original. Qual o problema de fazer adaptação? Por que eu vou escrever outro Bem Amado, se já existe um, e é bom? O cinema de autor cria um trilho difícil. Você tem 60 filmes alternativos, 20 que procuram o público e cinco que encontram. Alguma coisa está errada”.



Fonte: http://veja.abril.com.br/noticia/celebridades/guel-arraes-faz-a-satira-da-esquerda-em-o-bem-amado

Crítica O Bem Amado

                                                                                                    








PORQUE A ESQUERDA TAMBÉM COMETE IMPROBIDADES


Um prefeito morre, Odorico Paraguaçu assume seu lugar e também a meta de inaugurar um cemitério na cidade. A ironia é que ninguém morre na cidade e ele não consegue inaugurar o tal cemitério. A esquerda da política brasileira é criticada nesse filme por também ser corrupta, mas diz que quando mente é para o bem do povo.


Confira o Trailer:

E assim, inicia a obra de Paulo Gracindo “O Bem Amado”, ganhando adaptação para o cinema pelas mãos da Globo Filmes, da produtora Paula Lavigne e do diretor Guel Arraes. O diretor não inova em seu filme, se assemelhando muito com “O Auto da Compadecida” devido às suas falas rápidas e ritmo frenético, característica típica de Arraes devido a presença da linguagem da TV em seus filmes.


Tudo é narrado por Neco (Caio Blat), jornalista em início de carreira que trabalha no jornal comunista de Sucupira. Por esse viés, Guel Arraes se apropria de “O Bem Amado” para falar de sua própria juventude na época da ditadura militar – ele é filho de Miguel Arraes (1916-2005), político pernambucano que levou sua família para o exílio na Argélia e na França.


Entrevista:
 
O filme se encerra com uma mensagem política sobre os dias de hoje: além de ser um ano eleitoral o desfecho acontece em cima do mapa da América Latina que transforma o inscrito “Brasil” em “Sucupira”, ou seja, todo o Brasil é como a cidade de Sucupira, possui corruptos, promessas não cumpridas e a sociedade alienada ao poder.


O BEM AMADO (Brasil, 2010)
Gênero: Comédia
Elenco: Marco Nanini, José Wilker, Caio Blat, Maria Flor, Matheus Nachtergaele, Zezé Polessa, Andréa Beltrão, Tonico Pereira, Drica Moraes, Bruno Garcia, Edmilson Barros
Roteiristas: Guel Arraes, Claudio Paiva
Diretor: Guel Arraes

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Crítica O Auto da Compadecida







A FOME, A SECA E A MISÉRIA HUMANA CONTADOS DE UM JEITO BEM IRREVERENTE












Relações baseadas na mentira, na hipocrisia, na lei do mais fraco e do mais forte. A miserável vida humana se torna engraçada e divertida, embora trágica, no texto de Ariano Suassuna adaptado para a TV, e depois para o cinema, por Guel Arraes. Um dos filmes de maior bilheteria no Brasil, um dos mais engraçados e originais. Embora seja uma adaptação não tem outro igual.

Em O Auto João Grilo (Matheus Natchergaele) inteligente e mentiroso com um alto poder de convencimento, e Chicó (Selton Melo) covarde contador de histórias, estão em busca do pão de cada dia e enfrentam a vida como podem. Fazem de sua tristeza a nossa alegria quando enganam, das mais variadas formas, o padeiro e sua mulher, o padre, o bispo e o major. Ao final todos serão julgados por Deus, Nossa Senhora e o Diabo por seus pecados. Personagens divertidos que representam toda uma estrutura social: a burguesia, o clero, o poder político e os pobres servis. Apesar da obra ter sido escrita em 1955 seus personagens estão muito bem representados em nossa sociedade, embora essa esteja muito mais diversificada.

O história todos nós já conhecemos. Mas, o que Arraes trouxe para a cinematografia do filme é diferente. A linguagem da TV é perceptível, uma vez que a cenografia é extremamente trabalhada, as cenas são rápidas, há muitos planos médios e pouco (ou nenhum) enquadramento inusitado e até um som característico, em determinadas situações, para as falas dos personagens é construído. O uso de efeitos especiais foi um diferencial no filme. A cada flash back de Chicó, para contar suas histórias sem sentido, usou-se recursos especiais, assim como no momento do julgamento em que João se cura do tiro que levou, as portas do inferno se abrem e o Diabo mostra sua verdadeira face.

O julgamento de João Grilo: 



A religiosidade está presente do início ao fim. Até mesmo um aspecto ideológico foi percebido quando no momento em que Chicó cita a fala “ encontrou-se com o único mal irremediável, aquilo que é marca de nosso extremo destino sobre a terra, o fato sem explicação que iguala tudo que é vivo em um só rebanho de condenados, porque tudo que é vivo morre”, imagens dos 12 passos de Jesus Cristo para a morte e ressurreição são mostrados. Sem dúvida esse é o melhor filme de Arraes, embalado por um trilha sonara inconfundível, tornou-se inesquecível.

Trailer: 


O Auto da Compadecida Brasil , 1999 - 104 min. Comédia
Direção: Guel Arraes
Roteiro: Ariano Suassuna
Elenco: Fernanda Montenegro, Matheus Nachtergaele, Selton Mello, Denise Fraga, Diogo Vilela, Marco Nanini, Lima Duarte

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Crítica Romance










A NOVA PERSPECTIVA DE ARRAES















Romance, sem dúvida, é o filme diferente de Arraes. Sem abandonar o lúdico e deixando o lado cômico de lado, Arraes faz um sútil drama e ainda sobrou espaço para flertar sobre questões polêmicas entre cinema, teatro e televisão. As características TV como roteiros banais; histórias comuns; custos de produção e rentabilidade são apresentadas. Nas novelas há 50 milhões de pessoas esperando o que o mocinho e a mocinha vão fazer; qual final irá ao ar, sendo que o fim de Cinderela é esperado, pois a solução para os problemas precisa ser positiva.

Arraes dialoga TV, teatro e cinema em um só momento. A lógica de produção da TV e o compromisso com a arte do teatro são discutidos no filme, mesmo que sem causar grande impacto. Ana (Letícia Sabatella) e Pedro (Wagner Moura) estão desenvolvendo a montagem teatral de Tristão e Isolda e acabam se apaixonando. A vida real e a lenda shakespeariana se misturam, ao ponto de o casal, no início do filme, parecer chato por repetir as falas dos amantes incansavelmente. O que é compreensível por estarem apaixonados. Ao som de “Nosso estranho amor” de Caetano a história acontece.



Tudo vai muito bem até Ana ser convidada para fazer uma novela. O casal se afasta a medida que ela ganha fama. Eles permanecem três anos afastados. Ana agora já está saturada de se submeter a lógica da indústria da arte e então sugere a gravação de uma minissérie. Pedro será o diretor sendo que Tristão e Isolda agora vão ser retratados no nordeste. Arraes não abandona a estética lúdica da TV. Investe em cortes mais lentos, closes e planos médios. Durante as gravações no nordeste está a novidade dos planos gerais da paisagem árida, dos galopes a cavalo, do casal apaixonado. Até mesmo o uso de músicas que narram exatamente o que está acontecendo é realizado, assim como em “Deus e o Diabo na Terra do Sol”. Uma cena engraçada é o ataque de estrelismo do personagem de Marco Nanini em pleno sertão.

Mais que um Romance em que amor e dor estão unidos, e vistos como necessários a paixão, o filme faz sátira do comportamento da indústria da arte, no caso a televisão. O fato de se construir favelas cenográficas para gravações, incluindo água, luz e saneamento básico e realizar filmagens de vários finais pensando no que a audiência vai gostar é retratado. Pode-se fazer referência a TV Globo ou não, o fato é que algo novo surge nesse filme, embora ainda não seja um dos meus preferidos. Outra coisa é que não consigo encontrar o motivo da personagem de Ana falar tanto palavrão...

Trailer



Direção: Guel Arraes
Ano: 2008
Roteiro: Jorge Furtado,Guel Arraes
Elenco: Wagner Moura (Pedro), Marco Nanini, Tonico Pereira, Vladimir Brichta (Orlando), Bruno Garcia, Letícia Sabatella (Ana), José Wilker, Andréa Beltrão

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Crítica Lisbela e o Prisioneiro










A MOCINHA, O MALANDRO HERÓI CONQUISTADOR E O PISTOLEIRO MATADOR: A MESMA HISTÓRIA SÓ QUE TUDO É DIFERENTE.


A graça não é saber o que acontece e sim como acontece e quando”. Essa é uma das frases ditas por Lisbela, a mocinha, logo no início do filme. Um longametragem dirigido por Arraes em que é possível enxergar referências ao cinema clássico americano (dos gêneros), de um jeito bem brasileiro, ou no mínimo nordestino. Tudo acontece como se a comédia romântica clichê, os duelos dos westerns, o terror da ficção cientifica e até um pouco das novelas do rádio fossem mostrados em um só filme. 

A mocinha Lisbela (Débora Falabela), fã de cinema americano, está prestes a se casar com Douglas (Bruno Garcia), o noivo metido a galã e carioca, mas conhece Leléu (Selton Melo), herói conquistador e malandro, e se apaixona. Ela terá que decidir entre o certo e incerto, além de tentar impedir que Frederico Evandro (Marco Nanin), pistoleiro matador que se parece com Reginaldo Rossi, mande Leléu conversar com São Pedro mais cedo por ter se envolvido com sua esposa Inaura (Virginia Cavendish), a sedutora. Já sabe o final? Nós também, logo no início do filme, mas nem por isso assistimos o longa com desdém ou deixamos a sala por saber o que acontece no fim, afinal “a graça não é saber o que acontece e sim como acontece e quando”.


Veja a cena inicial do filme:


O nordeste nesse filme é retratado de um modo mais pop, a pobreza característica do sertão não aparece, trata-se de uma das super produções da Globo Filmes. Entre os ambientes explorados podem-se destacar as feiras, os bares, o parque de diversões e a sala de cinema, além de um nordeste muito colorido e recheado de sotaques engraçadíssimos. Aliás percebemos que se trata do nordeste pelo sotaque e pelo fato de os personagens dizerem sua localização geográfica.

Personagens simples, um texto irreverente, envolvem o espectador que desponta muitas risadas. Utiliza-se uma estrutura narrativa tradicional exceto pelos sucessivos cortes entre cenas que relacionam o que é real e o que não é. A história de Lisbela e Leléu é relacionada com cenas de filmes americanos vistos pela mocinha. Cortes rápidos e sucessivos intercalam o que é real e o que é ficção como na cena do primeiro encontro entre o casal e a cena em que Frederico, Leléu e o touro se cruzam pela cidade. A linguagem da TV talvez apareça por meio do modo como os personagens e o ambiente são explorados na lente da câmera. Sempre há duas pessoas conversando e essas aparecem em plano médio ou primeiro plano, assim como nas cenas de novelas da TV. Há ausência de planos gerais e muitos closes nos personagens principais. A iniciativa de levar o espectador a se ver no cinema é uma ideia que desperta ainda mais a sensação de identificação com o que se está vendo e vivendo.


Confira mais uma cena:




Confira o trailer:



Lisbela e o Prisioneiro 
Brasil , 2003 - 105 min. 
Comédia / Romance
Direção: Guel Arraes
Roteiro: Guel Arraes, Jorge Furtado, Pedro Cardoso
Elenco: Selton Mello, Debora Falabella, Marco Nanini, Virginia Cavendish, Bruno Garcia, André Matos, Lívia Falcão, Tadeu Mello, Aramis Trindade, Heloisa Perisse.